Das razões da cultura sobre nosso corpo
Médicos do Brasil Imperial promoviam a amamentação com estímulo à culpa e medo.
Confira a matéria clicando na ilustração de Ivan Wasth Rodrigues
Vocês sabem que somos tod@s a evidência de que informações justas e adequadas fazem a diferença no momento de brincar com nossa sexualidade: nas relações de prazer, na gravidez, parto e puerpério, ou amamentação e cuidados com os filhotes.
Como somos bicho-mãe e mulheres humanas, somos seres biopsicossociais, fisiológicos e culturais. Isso significa que até o ato de fazer cocô, para a gente, é simbólico: tem significados outros, além de ser o ato fisiológico de evacuar as fezes. Cada um o vive e percebe de um jeito diferente do outro! Aposto até que muita gente achou de mau gosto o uso do termo referente ao 'cocô' aqui no blog, preferindo muito mais a segunda opção, não é mesmo?
Pois bem. Somos assim mesmo. E manter esta perspectiva de distanciamento da nossa própria cultura, quando tratamos de questões de saúde, é melhorar o entendimento que temos sobre as dinâmicas médico-hospitalares, os processos de saúde-doença dos sujeitos, e a nossa própria experiência nesse meio.
Parir é cultural
Não raro, digo que as dificuldades por que passei durante a gestação (inúmeros encontros com diversos profissionais, insegurança, desajuste de interesses, choro), para parir Iara sem intervenções são mesmo o motivo do meu ativismo.
Brasileiras, temos nossos corpos peculiarmente dominados pelas instituições médico-hospitalares.
Nota 1: Falo dos 84,5% de cesáreas praticados no país (Fonte: http://www.ans.gov.br/portal/site/informacoesss/informacoesss.asp), mas falo também, das nossas gestações cuidadas no esquema padrão. Será que todas estas gestações têm problemas fisiológicos?
Nota 2: Outras instituições também subjugam nosso corpo e autonomia, como a Igreja e o Estado. O exemplo é a questão do aborto, que aqui ainda está no mérito de ser debatida pelos varões católicos e evangélicos do Congresso Nacional. Esta situação de fato é a tragédia da vida privada. O aborto clandestino condena milhares à morte – se já somos super maltratadas em pleno processo de parturição, no maravilhoso ato de dar à luz, quem dirá em caso de abortamento? Por isso vale a pena assistir a filmes tais como o que a Carolina Pombo do What Mommy Needs compartilhou via FB (ié, estamos on, babe):
Para repensarmos as situações que nos são dadas. Em outras palavras, vida de gado com a nossa própria saúde não rola, né?
Nota 3: Confira no Blog Mamíferas a polêmica discussão que está rolando sobre a amamentação, se é direito ou dever das mães. A simples colocação deste debate em pauta já evidencia que somos bichos culturais, ou seja, não amamentamos porque produzimos leite e ponto (assim como as outras mamíferas), amamentamos porque produzimos leite e sobretudo porque queremos amamentar.
Nota 4: Culpa e medo não são recorrentes ainda hoje na relação médico-mulher paciente de saúde materno-infantil?
Para finalizar, vale repetir então a importância de preparar-se emocionalmente para parir. Parto é 50% fisiológico (biologia-corpo) e 50% emocional (cultura-mente). Não basta a gestação saudável, é preciso entregar-se à experiência, coisa que a maioria das brasileiras desaprendeu a fazer.
Sozinhas, extremamente medicalizadas e passivas, em poucas décadas, a maioria das mulheres perdeu a confiança inata na sua capacidade de parir.
Lucía Caldeyro Stajano - Associação Nacional de Doulas, ANDO-Campinas.
E você com isso tudo? Conte para a gente tudo o que quiser, pois são temas tão distoantes e próximos. Nossos.
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