quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Relatos: Partos Naturais Hospitalares


Engravidei a primeira vez aos 22 anos e confesso, não estava preparada psicologicamente para abraçar a maternidade. Ao contrário do meu marido, custei algumas semanas até digerir a informação de que, a partir dali, a minha vida seria diferente, muito diferente. Ele se fez pai antes que eu me descobrisse mãe.
O apoio dele e sua serenidade foram cruciais para me conduzir para o caminho que trilharia para maternar. E o mais importante: percorreríamos juntos.
Durante toda a gravidez aprendi a equilibrar medos e desejos, amadurecê-los para que deles nascessem as escolhas. E uma, das tantas que fazemos ao longo do percurso, foi a forma de trazer a minha filha ao mundo.
Bia nasceu de um parto natural super desumano. Lembro-me de como  estava assustada na entrada do hospital e do barulho de um portão se fechando. Lembro ainda de ter visto as lágrimas escorrendo do rosto do Paulinho do outro lado do portão e com olhares assustados nos despedimos.
Estive só durante todo o período em que fiquei hospitalizada. Sem acompanhante, sem apoio. Estava sozinha transformando medo em coragem. O trabalho de parto durou uma madrugada inteira, mais por falta de preparo, acredito eu. Instintivamente lutava contra as contrações, repelindo-as. A bolsa só veio romper quando eu estava com seis cm de dilatação e eu estava exausta e carente, aguardando pacientemente que alguém viesse me socorrer, trazendo algum conforto, no "sofredouro".
Entendi esse processo como uma metamorfose. A cada dor, me aproximava mais da minha filha. A cada dor, me aproximava mais da mãe que me tornaria. Com o dia claro, fui convidada a me fazer presente na sala de parto. Estava exaurida e a cadeira sugeria um parto na posição ginecológica. Tentei obedecer em vão... até que, seguindo meu próprio instinto, agindo de ímpeto, fiquei de cócoras, para espanto da plateia. Lembro-me do nervosismo da médica, que batia nas minhas pernas que com olhar duro e tom ameaçador disse-me que minha falta de cooperação mataria a minha própria filha. Foi então que fechei os olhos e me concentrei na que seria a última contração. Estava num universo paralelo, totalmente inebriada de sentidos, até que nascemos. Mãe e filha. E como gostaria de perpetuar a sensação de tê-la saindo de mim! É indescritivelmente mágico! Transformadora.
Cinco anos mais tarde, resolvi engravidar e, decidida, antes mesmo da concepção que teria mais um parto natural. Prometi a mim mesma que o segundo seria muito diferente do primeiro, embora o prazer do nascimento em si fosse um velho conhecido meu.
Fui muito feliz nas duas gravidezes, sem nenhuma intercorrência que merecesse cuidados especiais. O que me deixava mais tranquila para encarar o parto. Tudo estava indo muito bem, quando, na quadragésima semana, numa consulta de rotina, a obstetra que até então havia falado que esperaríamos o tempo que fosse necessário, resolveu intervir, tentando transformar meu sonho em frustração.
Fez uma guia de internação e pediu que eu desse entrada no mesmo dia. Alegou que o bebê estava com dorso à direita. Sinceramente, com tanta informação que temos acesso hoje em dia, achei que ela fosse usar uma desculpa mais elaborada. Saí de lá ciente de que EU poderia esperar um pouco mais.
Pedi uma ultrassonagrafia que comprovasse o bem estar do bebê, mas ela se negou. Ao sair, prometi que ligaria, quando desse entrada nos papéis e fui direto para o posto de saúde perto de casa e pedi uma guia de US.
O ultrassonografista foi um anjo!!! Disse que o bebê estava muito bem: batimentos cardíacos, quantidade de líquido, maturação da placenta e mesmo acusando um peso de 4.125kg, ele informou que há uma margem de erro de 600g para mais ou para menos, que eu não me preocupasse - era um incentivo. Ah! E o bebê estava com dorso à esquerda, vejam vcs! Garantiu ainda, que poderia esperar tranquilamente até as 42 semanas. E assim o fiz, sem médicos. Confiando na vida e no meu corpo.
Nos momentos finais, quando o cansaço apareceu para desmotivar, contei com a ajuda de uma doula-anja, a Gabi Zanella. Aprendi com ela que não devemos lutar contra as contrações, mas ter a consciência de que elas encurtam o caminho até o nascimento. Aprendi também que a respiração está intimamente ligada à vagina e que podemos através dela, controlar a dor. Aprendi ainda que sexo e chá de canela são ótimos para estimular o parto.
Até que chegou o dia em que estávamos preparados. Amanheci diferente, barriga baixa, pequenas dores...tomei o café da manhã com a minha filha que, a partir dali, deixaria de ser única. As contrações ficaram mais fortes, o que serviu para que eu espantasse a incerteza. O transporte levou a minha filha para escola e, sozinha, comecei a me preparar para a chegada do meu menino. Cantava, andava, sorria e chorava.
Andei por horas, só isso aliviava as dores das contrações. Respirava e vivia cada contração como quem vai ao encontro de alguém que se quer muito reencontrar. Para não correr riscos, pedi que me levassem para o Hospital Universitário de Florianópolis, pois tinha certeza de que só interviriam em caso de necessidade. Cheguei lá com seis cm bem vividos de dilatação.
Dessa vez, pude ter a presença de um acompanhante - o meu amigo, o meu parceiro, o meu marido. E como faz diferença tê-lo tido ali, a me reconfortar. Não senti dor, aliás nunca me senti tão consciente do meu corpo! Tudo o que fiz foi andar, enquanto silenciosamente e através de olhares conversava com o Paulinho. A bolsa foi rompida aos 8,5cm de dilatação. Tive tempo de tomar um banho e seguir para sala que havia escolhido previamente. A equipe me chamava pelo nome e me encorajava, apesar de não ter sido humanizado em todos os termos, sentia-me acolhida. Estava segura.
Fiquei de cócoras, fechei os olhos e nascemos. Mãe e filho. Chorei eu e chorou o pai. Esse de emoção, mas chorei por ter sentido mais uma vez um filho saindo de mim, chorei por ter estado ativa durante todo o processo, chorei de alegria...por ter confiado em mim e ter seguido adiante. Nos demos as mãos para receber o pequeno, que no meu colo ouviu baixinho "viste na hora exata, com ares de festa e luas de prata..."
Da primeira vez, queria mas não sabia que podia.
Da segunda vez, queria e nunca duvidei que conseguiria.

_Daniele Brito, 33 anos, mãe de dois. Uma menina de 10 anos e um menino de 4 anos e meio. Escreve o Balzaca Materna, um blog autoral.

Um comentário:

  1. Que lindo chorei aqui ao ler esse relato! Sou mãe de um menino lindo de três anos e o trauma emocional do parto "normal" que tive dele me castiga até hj... Quando penso na alegria do nascimento do meu filho sempre lembro após o parto e nunca durante pois pra mim me traumatizou muito! Espero um dia dar um irmãozinho(a) a ele e ser mais feliz no parto como vc foi! Bjos

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