Ter um bebê. Gerar uma vida. Trazer um filho ao mundo. Mais do que isso: uma enorme e única experiência. Bem além de simplesmente gestar e parir, a maternidade ganha um significado diferente para mulheres que buscam viver esse momento a fundo. Sem temer uma das sensações mais mitificadas da humanidade - a dor do parto - elas querem vivenciar o nascimento dos filhos de uma forma natural, sem intervenções, procedimentos, cirurgias, ao contrário da voz corrente que instituiu a cesariana como regra para os nascimentos no Brasil. Elas querem ser donas do próprio parto - um direito que, embora elementar à primeira vista, é freqüentemente desrespeitado pelo profissionais de saúde e contestado por familiares. Mas com uma coragem de mãe que defende a cria, elas vão à luta, peitam, contestam o sistema, se ajudam. E em um trabalho de parto simbólico, mostram o que desde sempre a humanidade soube: nascer é o ato mais natural do mundo.
Texto de pernambucopontocom, extraído do Youtube.
Informação - Saúde - Direitos - Autonomia
quarta-feira, 27 de janeiro de 2010
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Coragem, fé e paciência
Eu dou à luz prazeirosamente, facilmente e sem complicações.
Eu não estou receosa.
Eu confío que meu corpo sabe exatamente o que está fazendo.
Eu confío em minha habilidade de parir meu bebê.
Durante o trabalho de parto e o nascimento, eu fico completamente relaxada e confortável.
Eu confío que eu tenho a ajuda interna.
Eu mereço um parto fácil, sem complicações.
Eu tenho um parto sem dor, fácil, calmo, emocionante e prazeroso.
Meu bebê é saudável e está ótimo.
Eu estou cooperando completamente com meu corpo.
Ele está ficando macio, relaxando, se abrindo.
Sinto confiança.
A coragem e a paciência são necessárias para receber com alegria meu bebê em meus braços amorosos.
Meu corpo é feito para dar à luz de forma agradável e fácil.
Eu acredito que o nascimento do meu bebê virá rapidamente, pacificamente e facilmente.
Meu corpo está relaxado completamente.
Meu bebê é carregado com prazer puro.
Relaxo.
Tudo está indo bem.
Libero todos os músculos abdominais.
Relaxo minha mente e músculos.
Coragem, fé e paciência.
Eu estou no controle completo do que está acontecendo comigo.
Meu corpo não é projetado para ferir-se. Meu corpo é inteligente e lidará com todas as situações eficientemente.
Mantenho respiração lenta e nivelada. Inalo a paz, exalo a tensão.
Mantenho minha mente na aceitação e entrega.
Eu não mostro absolutamente nenhum sinal de medo nem preocupação.
Minha única responsabilidade é controlar minha mente. Meu corpo vai parir meu bebê de forma segura e eficaz.
O nascimento do meu filho faz o caminho. Meu corpo tem um espaço aberto largo para meu bebê descer. Não há nada no caminho.
Meu corpo dará à luz em seu próprio tempo.
Eu tenho um parto feliz.
Dar à luz é um ato altamente criativo cheio de sentimentos intensos. . . momentos de prazer e êxtase.
Nossas expectativas não afetam somente como nós vemos a realidade, mas afetam também a própria realidade.
Eu entro em um estado alterado de consciência que permite a liberação segura e fácil de meu bebê.
O nascimento é uma ocorrência natural para que meu corpo foi projetado perfeitamente.
Eu tenho o poder de lidar com o que quer que aconteça.
Não haverá nenhuma complicação.
A serenidade total é minha base.
Eu acredito em mim e não tenho nada a temer.
Eu dou à luz na segurança e solidão.
Eu não luto com o parto de nenhuma maneira.Meu corpo está totalmente relaxado. Eu não estou receosa.
Meu corpo é preparado para parir eficientemente, naturalmente e sem complicações.
O nascimento é um evento alegre.
A mente é tudo.
Nós nos transformamos no que nós acreditamos.
Acreditar faz acontecer.
Eu sigo meus instintos e dou à luz do jeito que eu desejo.
Eu estou pronta e preparada para isto.
Meu trabalho é simplesmente relaxar e permitir que o parto aconteça.
Eu me vejo lidando com tudo lindamente.
Eu mereço esse parto!
Eu não estou sozinha. Eu me ligo ao poder, força e a grande energia das 300.000 mulheres que estão parindo ao mesmo tempo que eu em todo o mundo.
Eu estou pronta, preparada e eu me entrego completamente ao processo para o qual meu corpo foi tão bem projetado.
Arte do http://www.fertilitymoon.com/
Antes que eles cresçam
_Por Affonso Romano de Sant´Anna*_
Há um período em que os pais vão ficando órfãos de seus próprios filhos. É que as crianças crescem independentes de nós, como árvores tagarelas e pássaros estabanados. Crescem sem pedir licença à vida. Crescem com uma estridência alegre e, às vezes com alardeada arrogância. Mas não crescem todos os dias, de igual maneira, crescem de repente... A criança está crescendo num ritual de obediência orgânica e desobediência civil... Esses são os filhos que conseguimos gerar e amar, apesar dos golpes dos ventos, das colheitas, das notícias, e da ditadura das horas... Não mais os pegaremos nas portas das discotecas e das festas... Saíram do banco de trás e passaram para o volante de suas próprias vidas... Eles cresceram sem que esgotássemos neles todo o nosso afeto... O jeito é esperar: qualquer hora podem nos dar netos. O neto é a hora do carinho ocioso e estocado, não exercido nos próprios filhos e que não pode morrer conosco. Por isso os avós são tão desmesurados e distribuem tão incontrolável carinho. Os netos são a última oportunidade de reeditar o nosso afeto. Por isso é necessário fazer alguma coisa a mais, antes que eles cresçam.
* Poeta, cronista e jornalista, editor do blog e site, respectivamente:
http://www.affonsoromano.com.br/blog/
http://www.affonsoromano.com.br/
Desenho de Mariana Massarani_mãe e filha_
domingo, 24 de janeiro de 2010
A humanização do parto como alternativa para um nascimento com respeito
_Por Ana Carolina Arruda Franzon & Bianca Cruz Magdalena_
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Hoje em dia temos muita pressa; é preciso viver rapidamente, pois “tempo é dinheiro”. A velocidade das informações e os avanços tecnológicos invadiram nosso cotidiano tão intensamente que mudaram até a forma de nascer. Nossos filhos vêm ao mundo com hora marcada, e já não recebem mais o mesmo respeito que tinham no tempo dos partos de nossas avós, por exemplo. Isso porque muitas mulheres são levadas pelos seus médicos a optarem pela cesárea, tanto por falta de informações, quanto por quadros clínicos aterrorizantes, como sofrimento fetal, circular de cordão, bolsa rota há muito tempo. Enfim, são inúmeros os motivos dados por aqueles doutores do saber biomédico que acreditam serem eles os protagonistas do nascimento, papel que deveria ser desempenhado pela mulher.
Em tempos passados, as mulheres podiam dar à luz e receber cuidados em casa, acompanhadas por parteiras e entes queridos – vale lembrar que, atualmente, o número de partos domiciliares vem crescendo nos grandes centros urbanos. Outra alternativa, que pode ser realizada também no ambiente hospitalar, é a escolha pelo parto natural e humanizado, sem as intervenções desnecessárias ou de rotina, que apenas servem para atender protocolos.
O medo das dores do parto sempre foi tão certo quanto o nascimento. Mas, muita coisa mudou nestes últimos anos. A medicina moderna possibilita um rol de procedimentos cirúrgicos “seguros” para aquelas mulheres que preferem não passar pelas dores do parto. Em 2008, aumentou para 84,5% o número de cesáreas na rede de saúde privada, de acordo com a Agência Nacional de Saúde Suplementar[1]. No Sistema Único de Saúde (SUS) a proporção é de 31%, caracterizando o Brasil como o segundo país da América Latina com maior índice de cesarianas, após o Chile.
Mas qual seria o motivo dessa escolha? Porque as mulheres não se apropriam de seus corpos e de sua saúde ao invés de confiá-los a um médico? Será que elas sabem exatamente por tudo o que vão passar no centro cirúrgico e no pós-operatório? Sabem realmente o que vão perder se optarem por deixar de dar à luz de forma natural?
Partos de baixo risco podem ser realizados seguramente em casa, com auxílio de profissionais da saúde como enfermeiras obstetras ou parteiras. Em algumas cidades brasileiras, as mulheres já podem optar pelas Casas de Parto, onde o nascimento é realizado sem as “cascatas” de intervenções que geralmente ocorrem nos hospitais (como por exemplo, a indução do parto com uso de ocitocina sintética, medicamento que aumenta as contrações uterinas, porém aumenta a intensidade das dores; analgesia para combater a dor, que impossibilita a mulher de participar ativamente desse momento, já que estará anestesiada, sendo obrigada a ficar deitada; episiotomia, que é um corte realizado na região do períneo, entre a vagina e o ânus, para facilitar a passagem do bebê). Ao invés de auxiliarem a parturiente, estes procedimentos muitas vezes são realizados de maneira desmedida, somente para acelerar o ato fisiológico que é o parto.
Um nascimento requer tempo, paciência e intimidade, pois quanto mais relaxada a mulher estiver, melhor será a experiência para ela e para o bebê, bem como a liberação de hormônios naturais como a ocitocina e a endorfina. E melhor ainda será se puder ter um trabalho de parto ativo, onde possa assumir a posição que melhor lhe conforte, podendo ficar em pé, caminhar, agachar, tomar banho, receber massagens e apoio emocional. Assim, poderá sentir e entender suas tensões e contrações, entrar no ritmo delas, e viver o nascimento de seu filho como algo prazeroso.
Afinal, trata-se da perfeição da natureza humana, já que segundo o obstetra francês Michael Odent, 73, “no parto normal, há a liberação de um coquetel de hormônios, que podemos chamar de hormônios do amor, que aumenta a capacidade da mãe e do bebê de amar.”.
[1] Caderno de Informação da Saúde Suplementar: Beneficiários, Operadoras e Planos, publicado em junho de 2009 pelo Ministério da Saúde/Agência Nacional de Saúde Suplementar.
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Vídeo da Clínica La Primavera - Instituto de Parto Humanizado, do Equador, sobre a importância da conscientização em um momento tão especial como o nascimento de nossos filhos, realizado com respeito e sem intervenções! Sublime!!!
sexta-feira, 22 de janeiro de 2010
Filho
"Um filho é como um caminho - há coisas boas bem ali, ao alcance da mão: amoras silvestres, fontes escondidas, sombras. E também há o mistério do destino, escondido no horizonte e na noite. Um filho é como o mar - espuma que brinca com pés descalços e funduras que nunca haveremos de compreender".
_Rubem Alves, pedagogo e educador_
quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
Mulher Barriguda
sexta-feira, 15 de janeiro de 2010
Carta de uma parteira: quero me sentir mulher
_Por Ana Cristina Duarte*
Se o meu marido me perguntasse isso, eu diria…
Porque esse é o meu último filho e eu preciso experimentar o que o meu corpo pode. Quero sentir meu filho passando através da minha bacia, abrindo meus ossos, fazendo-os quase quebrarem pela força dele dentro de mim. Quero sentir meu filho descendo e encaixando a cabeça nas minhas entranhas, milímetro a milímetro, como se estivéssemos dançando um tango emocionante, em que cada passo fosse totalmente calculado para um resultado perfeito. Quero sentir minhas mucosas cedendo espaço e esquentando a cada contração, quero sentir meu filho saindo pelo mesmo lugar por onde entrou. Quero me sentir mais perto de Deus ao ser capaz de produzir uma vida e colocá-la de forma segura neste mundo.
Quero sentir meu útero se contraindo com força, porque sou mulher e me sinto muito orgulhosa de poder gerar, gestar, parir e alimentar uma criança. Se eu não vim ao mundo para isso, então não sei exatamente o que vim fazer aqui. Quero sentir cada contração como se fosse o sopro de Deus direto para dentro do meu corpo, fazendo todas as minhas células tremerem com a energia desse evento. Quero que meu filho sinta cada uma dessas contrações como se fosse um abraço forte que dou nele, como se Deus pessoalmente o estivesse embalando.
Quero que ele perceba que algo importante e grandioso está para acontecer na vidinha dele. Quero que confie em mim para o resto da vida como sendo aquela pessoa que lhe deu a vida e o colocou em segurança para fora do finito espaço uterino. Quero que confie nele mesmo para sempre e saiba que com esforço e perseverança pode conseguir o que quiser. Quero que saiba que eu e ele juntos, com o apoio do pai dele e a torcida do irmão, podemos tudo. Que não há limitação para a nossa força.
Quero provar a mim mesma que sou uma pessoa capaz, que meu corpo não é meu inimigo. Pelo contrário, é meu amigo, meu companheiro, meu templo e meu porto seguro. Quero recuperar tudo o que perdi e o que me roubaram quando tive bebê pela primeira vez. Quero me sentir poderosa, forte, vitoriosa, criativa, emotiva, grande, bonita – durante o parto e para sempre.
Quero que meu filho nasça e venha imediatamente para o meu colo, os meus braços, os meus lábios, as minhas mãos, os meus peitos. E para isso preciso ter um parto natural. Quero que meu filho nasça em paz, sem dor, sem ser arrancado das minhas entranhas porque eu não me esforcei o suficiente.
Quero que, se as intervenções forem necessárias, só o sejam porque eu fiz tudo o que estava ao meu alcance para evitá-las. Quero que meu filho nasça livre de drogas, e que assim permaneça por toda a vida. Para que possa sempre sentir a beleza da vida de cara limpa, de pele limpa, de olhos limpos. Quero que ele se sinta calmo e seguro por estar sempre nos braços meus ou seus, ouvindo minha voz ou a sua, e não fique sozinho chorando num berço aquecido, sem um único som familiar para se acalmar.
Quero me sentir mais capaz quando tudo isso terminar. Uma bruxa, uma deusa, uma sacerdotisa do meu templo particular. Quero sentir minhas entranhas se abrirem e desabrocharem dando uma vida nova a essa criança. Quero sentir a dor, a ardência, o tremor, o prazer e a glória de parir. Quero me sentir mulher.
* Obstetriz pela Universidade de São Paulo (USP) Leste, doula e Coordenadora do Grupo de Apoio à Maternidade Ativa (GAMA).
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
Relato de parto natural domiciliar após cesárea (VBAC ou PNAC) - trilogia
_Na voz da mãe
-->Ontem e essa madrugada minha cabeça revivia o tempo com você e seu marido e a Sil. De madrugada acordava e agradecia a Deus por tudo o que aconteceu. Sabe, eu quase desisti de ir; pensei:"É muita loucura...", mas não ficava sossegada com o meu não. Então, fiz o que faço sempre: conversei com Deus e pedi que fosse conduzindo tudo, abrindo os caminhos e me mostrando o que era melhor fazer. Na verdade, desde o seu primeiro contato, eu me comprometi. Eu não queria saber a distância, eu queria poder proporcionar a mais uma mãe o direito de ter seu filho naturalmente, sem intervenções. Eu dirigi a madrugada toda pra chegar aí, parei umas três vezes pra checar se estava certa e outras duas pra lavar o rosto. Durante a viagem, sem rádio eu sozinha o que eu fazia, cantarolava e orava a Deus; pedia por você, por Rudá, pelo seu marido e por mim. É eu tenho provado e visto o quanto Deus é maravilhoso e o quanto Ele age em minha vida, desde a minha gestação, que foi uma surpresa inesperada e que Ele me prometeu que eu veria o milagre que eu sonhara acontecer e foi assim, você deve ter lido contrariando todos as razões da lógica eu pari e em casa, e olha, um dia te conto os detalhes, foi mesmo milagre, ou melhor milagres. Eu pedi muito a Deus que me permitisse sentir as dores e as contrações para poder fortalecer as mulheres que pudessem passar por mim, e foi assim com você, eu sabia a intensidade da dor, eu não só imaginava, eu tinha a real experiência do que você sentia e sabia que você seria capaz. Quando eu cheguei pedi a Deus que me abençoasse e que me mostrasse claramente se algo não estivesse indo bem e olha o que aconteceu; o tempo todo o coração de Rudá ficou ótimo, ele conversava conosco e dizia que estava tudo bem. Não posso esquecer sua expressão quando te vi e você disse de sua alegria por eu ter ido, por não ter desistido. É... foi um dos partos mais lindos de que já participei, tudo a seu tempo: você foi muito forte, em momento algum chutou o balde e pediu analgesia, a garra de uma guerreira veio à tona e Deus mais uma vez me ouviu: te fortaleceu. Eu vibrei tanto de alegria quando Rudá nasceu, veio de novo em mim a mesma emoção de quando pari minha filha, uma explosão de alegria e muita ocitocina. Minha mama já estava cheia, na hora desceu mais leite. Muito lindo!!! Só pode vir de Deus algo tão perfeito, emocionante e transformador como é o nascimento natural. Eu costumo dizer que cada parto me transforma, e que cada parto me faz renascer; cada parto transforma a mãe em mais mulher e mais mãe e mais ser humano, e cada pai de igual forma!!! Eu voltei, estava exausta na segunda-feira no estágio, meu corpo dolorido, as pernas doendo do movimento de dirigir tanto em tão pouco tempo, mas a alegria e satisfação recompensaram tudo. Valeu à pena ter conhecido você e ter ido à Cananéia, agora, nossas vidas estão interligadas pelo nascimento tão lindo de Rudá. Um grande abraço e parabéns por essa experiência tremenda que é o parto.
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"Há uma semana atrás tinha em meus braços o rebento que tanto aguardei chegar, depois de um processo de 32 horas, aproximadamente, de esforço e resgate que começou na noite de sexta-feira, dia 21 de agosto, às 20h30min quando entrei em trabalho de parto, fase latente, com contrações regulares e dolorosas de aproximadamente 10 em 10 minutos; no início da semana meu tampão mucoso já tinha saído e estava com um dedo de dilatação, o que indicava que meu colo uterino estava amadurecendo, se afinando, para conceber Rudá nesse mundão!
As últimas semanas foram de muita ansiedade, barrigão grande e pesado; a cada mudança de lua pensava que estava chegando nossa “boa hora”, pois nunca deixei de acreditar e confiar que tudo daria certo e que depois de uma cesária desnecessária de minha primeira gestação, há sete anos atrás, quando Ícaro nasceu, nosso tão desejado e clamado parto domiciliar seria vitorioso, já que minha gravidez era de baixo risco, mesmo assim fortalecer o pensamento já era o início desse parir, pois muitas pessoas estavam me desestimulando e me chamando de “louca” por ter feito essa escolha.
Nessas 39 semanas me empoderei de muitas informações sobre o parto natural e humanizado em livros de referência ao assunto e nas listas e sites de discussão que circulam na internet, caminhos de descoberta, de lágrimas a cada relato lido, de medos e de um coração que pedia às forças da Mãe Terra que nos provêm e nutre de que Rudá seria recebido com amor e respeito, sem intervenções e medicalização, e como nada nessa vida é por acaso encontrei nesse trilhar, através do Blog Bebedubem, Flavia Penido que me apresentou (virtualmente, risos) Kátia Z. Assumpção Pedroso, um ser que teve as asas tiradas quando desceu a Terra, mas que não deixou de exercer sua vocação com aquelas lindas mãos pequeninas que amparou meu filhote na madrugada de domingo, dia 23, a ela nossa eterna gratidão, querida parteira!
Como narrava acima depois de ter passado a noite toda de sexta-feira com contrações dolorosas recebemos Kátia na manhã de sábado, já que estávamos cerca de 400 quilômetros de distância, pois moramos em Cananéia, no Vale do Ribeira, uma remota ilha no extremo litoral sul paulista e Kátia no Vale do Paraíba, em São José dos Campos, mas como imaginava que esse trabalho de parto poderia ser demorado confiamos em esperar a parteira chegar.
Assim que ela chegou me examinou, pressão arterial ok, batimentos fetais também, com dois dedos de dilatação, em seguida me pediu para caminhar, imagina, com tantas dores, mas apesar de ser teimosa fui com meu companheiro Juliano até à padaria, uns quatro quarteirões de casa, o que levou uns 30 minutos daquela manhã chuvosa.
Quando retornamos iniciamos os “hots”: chazinhos de camomila, bola de Pilates, banhos quentes, massagens, posições verticalizadas e em pouco tempo evoluí para cinco dedos de colo dilatado, Kátia disse a Juliano e Silmara, minha comadre que acompanhou meu parto e que mesmo não sendo doula soube me encorajar e acalentar, que até o início da noite Rudá nasceria!
Oras e a noite passou...
Lembro-me que até os sete dedos as dores eram suportáveis, apesar de intensas e que os banhos quentes eram maravilhosos, dado o relaxamento que me permitiam, mas depois disso confesso que era preciso garra para suportá-las e o tempo, que já não existia para mim, não passava!
A madrugada já tinha iniciado e o cansaço tomava conta de todos, mesmo assim essa equipe não tardava em ajudar, nesse aspecto não dá para deixar de comentar quanto é importante ter ao lado da parturiente pessoas especiais nesse momento, que tenham calma, que saibam doar; sempre comentava que imaginava que Juliano fosse ficar nervoso, mesmo porque quando vim com a idéia de ter nosso filho em casa ele logo disse: “Não me venha com essa idéia de antropóloga hein!”, porém sua devoção me espantou, tanto cuidado e zelo que foram primordiais para que eu também me mantesse confiante!
Fortes dores, cansaço de duas noites sem dormir praticamente, contrações bem próximas uma da outra, como ondas que vinham, atingiam seu zênite e iam embora, permitindo que eu respirasse, quase não conseguia gritar nesse estágio, alguns gemidos e pensamento firme, mentalizando que o útero estava se abrindo, permitindo passagem para Rudá que no seu tempo se despediria do local que lhe abrigou todos esses meses.
No entanto, essas últimas quinze horas de trabalho de parto ativo já estavam me esgotando, pensava comigo: “Porque ele não nasce?” e minha bolsa de águas nem tinha rompido ainda, o que era ótimo, pois o bebê estava protegido, mas caso isso ocorresse o processo também aceleraria.
Mas, tudo tem mesmo seu tempo!
A bolsa rompeu!
Ufa!
E as contrações se intensificaram progressivamente.
Já estava com o colo todo dilatado, 10 dedos, só tínhamos que esperar, foi quando resolvi tomar mais uma chuveirada, pois estava difícil suportar a intensidade da dor, de qualquer maneira penso que vivenciar, sentir essas dores foram um resgate em minha vida, resgate como filha, mãe e mulher, apesar dessa reta final já estar em outro estágio de consciência; me contavam piadas, me perguntavam se eu já havia visto algum animal parir (sim, minha gata!), como meu companheiro e eu tínhamos nos conhecido, como era nossa história, mas já não era eu que estava lá!
Depois desse último banho voltei para o colchão que estava no chão de nosso quarto e me pus de quatro, pois era como me sentia melhor, deitada era impossível!
Senti uma dor muito forte, fiz uma força instintiva junto com a contração e quando pensei que Rudá estava para nascer Kátia me disse que eu havia feito coco, o que me aliviou muito, pois tive muito incômodo no reto, dado que essas fezes deviam estar atrapalhando.
Em pouco tempo outras contrações, muito líquido amniótico saindo, como um rio caudaloso e escutava: “Rudá está vindo! Olha a cabecinha dele!”, nessa hora os gritos eram guturais, primitivos, vinham de dentro dessa mamífera que como um animal estava para parir, naturalmente, sem drogas alopáticas ou anestésicos.
Rudá coroou! Círculo de fogo, nossa... como queimava!
Depois de sair sua cabecinha o corpo veio rapidamente, pura ocitocina! E nossa cria nasceu!
Não dá para descrever esse momento... mágico, divino, abençoado!
Kátia o passou pelo meio de minhas pernas, mas eu tremia, assim Juliano o pegou e o deu em meus braços, ahhhhhhhhhhhhhhh, coisa linda!
Aquela energia que circulava naquele lugar era cósmica, celestial!
Em seguida, ainda com o cordão umbilical pulsando o coloquei em meu seio, depois de uns 20 minutos o pai cortou o cordão e ficamos juntinhos, corpo a corpo, olhos abertos para descobrir a aventura de viver!
Minha placenta não saiu, só pela manhã que consegui expulsá-la no banho, ainda tinha dores como cólicas, Kátia informou que um coágulo poderia ter se formado, por isso que ela não saia, quando finalmente senti a última contração e pude expelir de dentro de mim aquela que protegeu meu filhote, frondosa como uma árvore que surtiu seu fruto!
Ah! Parir, partejar, dividir, e ficar na sua cama, com sua família, no seu lar, nem dá para comparar com ter um filho num ambiente hospitalar... inóspito, frio, impessoal. Faria tudo novamente!
E naquela Lua Nova um novo trilhar se iniciou em nossos caminhos, um novo ciclo! Nesse feriado de sete de setembro plantaremos a placenta em nosso quintal, com a vinda dos avós de Rudá e comemoraremos mais um dia essa sementinha que brotou, devolvendo a terra e a Natureza o que o fortaleceu em meu ventre!"
Bianca C. Magdalena
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Texto redigido em 30 de agosto de 2009.
_Na voz da parteira
Kátia Z. A. Pedroso
_Na voz da dinda
-->
Quem sou eu para escrever sobre a vinda de um serzinho a este mundo, sendo que eu mesma ainda não exerço o belo papel de mãe? Sou a madrinha, fotógrafa oficial da gravidez e parto, doula amadora e amiga-irmã da mãe da criança. Por isso, aí vai...
Para relatar minha emoção em estar presente no grande momento do nascimento de Rudá vou precisar me constextualizar um bocado, relembrar momentos e só então contar como foram os momentos que passei junto ao casal de amigos queridos naqueles 22 e 23 de agosto de 2009.
Minha amizade com “os gordinhos”, como são chamados carinhosamente pelos amigos, iniciou-se aos poucos, sem muito alarde ou emoção. Tudo foi acontecendo aos poucos, fomos nos descobrindo, entendo nossas afinidades e mais do que tudo respeitando nossas diferenças que não são poucas. E as coisas foram fluindo...
Até que pela primeira vez nos tornamos cumpadres em meu casamento e de lá para cá somos uma família. Sim, a de sangue está distante, mas a de alma está sempre por perto.
E de tão próximos, posso dizer que desde o princípio da amizade eu me lembro da Bianca achando estar grávida em quase todos os meses. Sua menstruação nem atrasava e ela já ficava toda preocupada. E quanto dávamos risada com isso... A preocupação era sempre em vão. Até que em dezembro de 2008, no mês que ela nem esquentou a cabeça, a menstruação atrasou!!!
Foram dias crendo que em algum momento menstruaria, mas isso não aconteceu e uma tarde eu liguei para ela e recebi a seguinte informação: “é amiga, você vai ser tia”. Meu Deus, que misto de alegria e preocupação... Grana curta, Codorninha na faculdade, Bi sem emprego fixo e os amigos tão duros quanto! Como ajudar? Dando apoio, afinal, eu ia ser tia agregada! Nunca me esqueço que na noite do mesmo dia da notícia nos encontramos e ela me disse: “um filho é uma benção, sempre!”. Guerreira!
Avesso!
Durante sua gravidez não estive muito presente, ela precisou se ausentar da cidade em que vivemos, mas mesmo com a distância os pensamentos eram sempre voltados a ela. Sofri quando ela disse que faria o parto longe daqui por achar mais seguro, já que vivemos numa ilha e o hospital mais próximo fica a 40 minutos. E sou grata a ela por ter mudado de idéia.
Em maio de 2009 ela voltou para a terra do marzão e das montanhas encantadas e disse que teria o bebê em casa, num parto humanizado. Pirei! Amei! E dei o maior apoio. Desde minha adolescência eu dizia que se um dia fosse mãe, meus filhos nasceriam em casa, mas achava que isso não seria possível, achava que ninguém mais fazia isso...
O bom é que quando ela me contou sua escolha eu já estava mais informada sobre a “humanização do parto” por outra amiga que também já tinha feito essa escolha e pude apoiá-la.
Enquanto a maioria absoluta a chamava de louca, eu a admirava cada dia mais, ficava ouvindo-a por horas contar sobre suas leituras e pesquisas na internet sobre o assunto.
Me preocupava sim, mas quanto mais ela me munia de informações, mais eu acreditava no poder da natureza de Deus.
Minha mãe teve seis filhos, todos de parto normal (a primeira nasceu em casa) e sempre se indignou com o número abusivo de cesárias no Brasil. A educação que recebi dela me fez acreditar que a Bianca conseguiria.
E assim tudo foi se encaminhando e quando chegou agosto – o possível mês de nascimento do Rudá, já que ele poderia também nascer em setembro - eu “falhei” em alguns momentos e espero que a Bi não tenha sofrido demais com minhas falhas de madrinha de primeira viagem.
Estava tão ansiosa quanto ela e por várias vezes minha falta de maturidade no assunto não me permitiu ajudá-la corretamente. Eu dizia que sentia (quem era eu pra sentir alguma coisa?) que já estava chegando a hora, que ele ia nascer em breve, enfim, fui infantil!
A gota d'água foi um almoço em casa no qual ela achou que a bolsa pudesse ter estourado porque tinha sentido alguma coisa úmida na calcinha... Pronto! Eu já fiquei falando que ela estava com 5 dedos de dilatação, que ia nascer, que precisávamos ligar para a parteira... mais uma vez, infantil!
Fomos para o pronto-socorro da cidade e o médico disse que ela estava com nenhum dedo de dilatação. Me lembro do seu semblante ao sair do hospital, triste e cabisbaixa. Foi naquele momento que percebi que ela precisava que eu me acalmasse.
E foi o que eu fiz!
Tentei levá-la para caminhar algumas vezes, mas só consegui numa segunda-feira 17 de agosto, e nesse dia ela me contou que o tampão havia saído e que estava chegando a hora.
A Silmara de alguns dias atrás faria tudo aquilo novamente, mas eu me comportei como a mulher de quase 30 que sou e não fiz um carnaval com a notícia.
Fiquei feliz, mas de uma forma mais comportada.
Durante essa semana que o tampão saiu eu não apareci muito, não queria ficar pressionando-a, me lembro só de ter levado o casal ao médico e de ter recebido a notícia do 1 dedo de dilatação.
Felicidade!
E fomos conversando pela internet todos os dias. Até que na sexta-feira, 21 de agosto o Codorna passou em casa, tarde da noite e me disse: “Sil, está acontecendo, a Bi tem tido contrações de 10 em 10 minutos e já ligamos para a parteira”.
Fiquei parada, sem reação... Esperei tanto aquele momento e não sabia o que fazer. A Bianca já havia me dito que gostaria que eu estivesse presente no momento do parto, mas eu não soube como reagir. O Codorna me disse que achava que ainda demoraria e que qualquer coisa eles me ligavam. Por mim eu já ia pra casa dela naquele momento, mas precisei mais uma vez não agir por impulso. Foi duro pegar no sono aquela noite... Acordei antes das seis e fui correndo para a internet ver se tinha novidades. Que inocência a minha achar que uma mãe prestes a parir vai parar para escrever na internet, mas enfim, eu queria notícias.
E fui atrás dela, liguei para o Codorna e ele me disse que estava tudo bem, que a parteira havia chegado e já estava fazendo os exames... Alívio, a parteira chegou! Veio de São José dos Campos especialmente para o nascimento do Rudá. Um anjo!
Umas duas horas depois a Bianca me ligou avisando que estava com dois dedos de dilatação e que a parteira havia pedido que ela caminhasse um pouco para acelerar as contrações.
Mais uma vez vontade absurda de ir até lá, mas com medo de atrapalhar. Toquei meu sábado, fiz várias coisas e chegou uma hora que eu não aguentei e fui para lá.
Eram umas duas da tarde. Levei bolsas de água quente e uma vontade imensa de ajudar e estar perto dos amigos. Quando cheguei a parteira estava no computador, o Codorna fazendo comida e um clima que não era de parto. Fiquei meio perdida.
Na minha cabeça a Bianca estaria deitada na cama, gritando bastante, nós todos ficaríamos em volta falando faz força, ele está vindo, está vindo, nasceu! Nada a ver...
Quando cheguei, a parteira, muuuito fofa, me disse que estava feliz que teria alguém para fotografar. Apaixonei por ela na hora, ela não tinha noção para quem estava falando isso!!! A Bi estava no chuveiro, aliás, onde passou a maior parte do trabalho de parto e não me viu chegar. Quando saiu foi fazer o exame de toque e já estava com 5 centímetros de dilatação. Alegria geral!
Kátia, a parteira, acreditava que Rudá nasceria até às 18h do dia 22 de agosto e seria, para pânico da mãe, um leonino, assim como o pai. Mas não, ele queria agradar a mãe e fazer o que ela tanto pediu, nascer um virginiano organizado no primeiro dia do signo aos 23 dias de agosto e foi o que ele fez, mas até lá ainda tem muita história...
Esse exame de toque foi feito por volta das três da tarde e o próximo às 17h50. Nesse meio tempo vi a Bianca sofrer muito com as dores... o pai, a parteira e eu fizemos compressas com a bolsa de água quente, chá, massagens, etc. e acreditávamos que o momento estava chegando, mas neste segundo exame foi descoberto que ela ainda estava com 6 dedos e teria chão pela frente.
Os amigos que estavam reunidos aguardando notícias me ligavam sem parar, minha família de Itu também e eu conversava com uma grande amiga da Bianca que também tinha optado pelo parto natural, pela internet, ela dava dicas para eu repassar para a mãe em trabalho de parto. Modernidade misturada à tradição, ao natural, ao “antigo”...
E assim foi entrando a noite. O pai visivelmente cansado e a cumadre também. Assistir ao sofrimento dela despertava em nós uma espécie de dor solidária. Um cansaço de vê-la sofrer...
Certa hora da noite o Codorna olhou pra mim e disse: “Estou cansado de vê-la sofrer assim”...
Lindo!
E dá-lhe massagens, e dá-lhe pontos de acupuntura para aliviar a dor e para acelerar as contrações... Um trabalho em equipe! Equipe esta composta por mãe, filho, pai, parteira e cumadre, movidos pelo amor.
A bolsa não estourava e mais uma vez eu vivia um misto de alegria e preocupação... Alegria porque isso queria dizer que Rudá estava protegido no útero da mãe e preocupação porque na minha cabeça quanto mais demorasse para estourar, mais tempo duraria.
E foi então que às 23h27 a bolsa estourou. Me lembro que a Bi estava em pé, ao lado da cama com as mãos sobre a mesma e disse: “agora estourou”; e foi o que realmente aconteceu.
Gritamos viva e abraçamos a mamãe. Nesse momento me emocionei, ela agradeceu nossa presença e disse que só estava conseguindo porque estávamos lá... Tão lindo!
Daí pra frente as dores foram mais intensas e posso dizer isso porque vi o sofrimento dela aumentar. Ela pedia muito para o Rudá nascer, mas ele ainda esperou mais quatro horas e meia para nascer. E noite a dentro continuei minha função de amiga e cumadre: massagem, chá, bolsa de água quente...
Em um determinado momento ela estava deitada num colchão no chão, o Codorna estava amparando sua cabeça, a parteira fazendo massagem em seus pés e eu com uma bolsa de água quente em suas costas. Nessa hora eu e meus companheiros já não conversávamos como antes, estávamos cansados e eu pensava até quando ela ficaria sofrendo daquele jeito e mais ou menos nesse momento ela se levantou ficou de joelho no colchão e abraçou meu quadril (eu estava sentada na cama)... Naquele momento eu senti o quanto nossa amizade era verdadeira.
Meus olhos se encheram de lágrimas e me pus a fazer massagens em suas costas. Achei que era hora de interceder pela Bi junto ao Rudá e comecei a cantar: continue a nadar, continue a nadar, vamos Rudá, continue a nadar...
Depois disso ela resolveu ir para o chuveiro e lá ficou por poucos minutos, não mais como antes quando ficava por muito tempo. E quando voltou se colocou de quatro no colchão, fiquei novamente com a função da bolsa quente em suas costas e alguns minutos depois a Kátia falou que estava sentindo o cheiro do líquido amniótico, pediu que eu segurasse uma vela e me mostrou a cabeça do Rudá se aproximando... Quanta emoção!
Corri pegar a máquina fotográfica, pois se tinha um pedido da mãe era que eu fotografasse o momento do “coroamento” e foi o que fiz.
Foram várias fotos e ao mesmo tempo ajudando a Kátia e seguindo suas instruções... O pai parecia um bicho, olhava a cria nascendo e voltava correndo consolar a mulher... E às 3h56 do dia 23 de agosto de 2009 ele nasceu! Depois de 32 horas de trabalho de parto.
Eu estava tensa, enquanto o Rudá não abriu os olhos eu não fiquei bem... Me deu um pavor ele nascer e não abrir os olhos, não chorar, não se mover... Mas quando seus olhos se abriram e um chorinho bem leve tomou conta do quarto, foi só alegria! Ele foi passado por baixo da mãe, o pai amparou-o e enfim ela o pegou em seus braços... E dá-lhe fotos! Nessa hora eu já estava em prantos! Emoção sem igual! Meu sonho de assistir um parto enfim estava realizado e da forma mais natural possível.
Logo depois que ele nasceu, que a Bianca levantou do chão, sentou-se, ficou com ele pertinho de si, que enviei mensagens aos amigos avisando do seu nascimento, que o cordão foi cortado pelo pai, comecei a sentir uma cólica muito forte e minha menstruação desceu. Coisa louca esse mundo da natureza, esse mundo de Deus!
Acabei não podendo ajudá-la muito depois do parto, pois estava com muita dor, com uma cólica que há tempos eu não sentia. Mas mesmo assim fui até minha casa buscar aveia para que a Kátia pudesse preparar um mingau para ela e nesse momento meu marido foi até lá comigo, com a dor que estava sentindo nem conseguia mais dirigir. Fui sair da casa dela o dia já estava clareando e eu, assim como todos da “equipe”, precisávamos descansar.
Me lembro de ter chegado em casa, tomado um banho e ter ido deitar em minha cama pensando em como a vida é mesmo um misto de sentimentos. Mais uma vez eles se mesclavam em mim... alegria e dor. Dor porque a cólica estava realmente forte e alegria porque... ah... eu preciso mesmo explicar a razão da alegria?
Silmara Guerreiro
Parto normal
14 de maio de 2008
Pari. Dia 10 de abril. Sou contra ficar falando da própria intimidade; sobre filho, então, tenho horror. Não sei bem o que me faz tocar nesse assunto agora, mas aí vai... Antes de ter filhos, eu não sabia disso, mas existe uma tensão muito grande com relação a ter, ou não, um parto normal. Para algumas, e eu sou uma delas, não faz muita diferença. O que eu desejo é ver o bichinho do lado de fora, respirando. Eu nasci de cesariana, dois anos depois de meu irmão, que levou doze horas para nascer e teve de ser arrancado a fórceps. Então, lá em casa, a cesárea sempre foi bem-vinda. Eu sei que o Brasil é campeão mundial de cesarianas, feitas na maioria das vezes sem a menor razão, apenas por conveniência médica, vantagens no retorno financeiro do plano de saúde, ou por motivos idiotas, como escolher a arregimentação astrológica perfeita para o mapa astral do filho, ou até a proximidade do fim de semana. O mesmo tipo de insanidade que levou gerações e gerações a trocar o peito pelo leite em pó: o lucro, a ignorância e a comodidade. Portanto, eu respeito muito todo e qualquer incentivo ao parto normal no Brasil. A natureza, com seus milhões de anos de evolução, sempre foi a melhor opção, não tenho dúvida. Só acho que existem distorções do outro lado.Muitas vezes, quando digo que fiz cesariana, algumas moças que tiveram seus filhos de parto normal e se orgulham imensamente disso me olham com pena. O mesmo olhar do Michael Pilan, do Monty Python, no filme A Vida de Brian, quando o carrasco romano pergunta quase envergonhado para a fila de condenados judeus: "Crucificação? Sim... por favor, à esquerda...". Outras moças, quando respondem que fizeram cesárea, abaixam os olhos com angústia, como se não tivessem sido realmente mães, e respondem com voz embargada: "Mas eu senti tudo...", como quem dá uma desculpa fiada, um último pedido de piedade para que não a condenem por ter falhado como mulher. Isso não pode, isso não está certo. É injusto! Levar uma vida inteira para botar uma criança no mundo e ter um sentimento de falência porque não saiu como planejado, ter vergonha porque não pariu como manda a natureza! Ninguém merece, nem as moças, nem os filhos das moças. Essa é uma forma estranha de vaidade.
Pode ser que seja recalque meu. Não pari pelos caminhos naturais, mas isso não me causa sentimento de perda ou fracasso. Dizem os estudos que, entre todos os animais da Terra, a mulher sapiens é das que mais sentem dor ao parir. Tudo por conta de sermos bípedes e termos desenvolvido essa cabeça tão grande para pensar melhor. Bebês cabeçudos e quadris estreitos, uma combinação complicada. Para resolver a questão, a natureza fez com que paríssemos bebês prematuros, se comparados com qualquer bezerro, que mal nasceu e já está andando. Para criar nossos bebês indefesos, inventamos coisas tão incríveis como a família e o amor conjugal. Mais tarde, usamos nossa cabeça grande para criar outras coisas impressionantes, como a ciência, a política, a arte e a religião. Tudo isso nos é natural. Os avanços da medicina também fazem parte da mãe natureza e têm ajudado muitas mães a colocar filhos amados no mundo. Sofrer por vaidade não fica nem bem para uma mãe.
Crônica de Fernanda Torres
Mãe é mãe, parto é parto. Mulher é tudo vaca? (Ou tautologia para gestantes)
Cara leitora (ou leitor): você sabe o que é tautologia? Trata-se de uma figura da retórica cujo objetivo é expressar uma mesma idéia de maneiras diferentes. Por isso, não raro, é tida como sinônimo para pleonasmo ou redundância. Mas para a Filosofia ou outras Ciências Humanas um argumento tautológico vai além da mera expressão em outros termos e pode ganhar contornos falaciosos, uma vez que, quando aplicado a um sistema lógico, não oferece saída a sua própria lógica interna. Complicado? Não mesmo! Todos nós já vivenciamos a experiência tautológica; e diversas vezes. Por exemplo, quando buscamos nosso primeiro emprego precisávamos da tal “experiência” para sermos contratados, mas sem trabalho como adquirir experiência? Ou ainda, quando ouvimos frases do tipo “uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.
Os mais novos talvez não se lembrem ou nem conheçam o grande (?) sucesso do Casseta Popular “Mãe é mãe”, que inspirou esse título. Tudo bem, eu, Natalia Cordoniz Klussmann, coloco aqui o refrão:
“Mãe é mãe, paca é paca!
Mãe é mãe, paca é paca!
Mãe é mãe, paca é paca!
Mãe é mãe, paca é paca!
Mas mulher... Mulher... NÃO!
Mulher é tudo VACA!
Mas mulher... Mulher... NÃO!
Mulher é tudo VACA!”
Eis aí um grande exemplo de tautologia aplicada, debochada, difundida e musicada.
Ora, pergunta-se a nobre leitora, o caro leitor, e o que tem a ver tautologia com parto? Ora, respondo eu, tudo!
Na luta diária pela Humanização (assim mesmo, com letras maiúsculas para dar destaque e mostrar o quão nobre é esse valor) ao atendimento à gestante e à parturiente encontramos muitos sistemas tautológicos. É uma lógica própria, aparentemente impossível de ser quebrada ou contestada: o médico que só faz cesárea porque não se sente seguro com a sua experiência prática em parto normal; o medo do parto que aumenta a dor da contração, que aumenta o medo, que aumenta a dor, que aumenta o medo...; explicações e justificativas para cesáreas tão estapafúrdias como “foi assim porque foi assim”; e tantos, mais tantos outros exemplos, que tenho certeza vocês lembrarão e incluirão nessa listinha.
Contudo, existe um sistema tautológico que realmente me deixa possessa quando o assunto é a Humanização do nascimento, pois cria uma barreira que inviabiliza a discussão saudável – principal arma contra radicalismos e ignorâncias – do tema. Trata-se da máxima: “não sou menos mãe porque tive uma cesárea”, geralmente ouvida após a afirmação (correta e não-radical) de que cesárea não é parto: é intervenção cirúrgica de médio porte. E cria-se, assim, o sistema: “não é humanizado porque não me inclui não me inclui porque é humanizado”.
Ora, não misturemos alhos com bugalhos, como diria minha falecida bisavó. Mãe é mãe, parto é parto! E mulher?
Bom, antes de responder sobre a mulher, vamos falar só mais um pouquinho sobre partos e mães.
Parto é parto. Parto é antes de tudo um procedimento fisiológico e natural. Acontece com a expulsão fetal da cavidade uterina e, assim como hemodiálise não é fazer xixi e lavagem estomacal não é vômito, cesárea não é parto. Cesárea é intervenção cirúrgica. Deveria ser feita somente quando o processo natural e fisiológico não pode seguir o seu rumo.
E mãe? Ora, mãe é mãe. Mãe é aquela pessoa que cuida, que alimenta, que troca, que conforta, que educa, que serve de apoio e referência para um ser em formação. E , assim como mãe adotiva é tão mãe quanto uma mãe biológica, a mãe que pariu é tão mãe quanto à mãe que foi submetida à cesárea. Ponto final.
Mas e a mulher?
Bom, aí é que entra toda a questão. Quando uma mulher se sente magoada ou agredida ao ouvir “cesárea não é parto”, com certeza está incomodada com o estigma da “anomalia”, da coisa fora do padrão, que vem colado ao nome “cesárea”.
Nós, seres ocidentais, da fronteira entre os séculos XX e XXI, seres globalizados e engolfados pela loucura tecnocientífica, vivemos uma alucinada busca pela identidade. Ora queremos e precisamos nos sentir seguramente iguais, pertencentes a um grupo, ora desejamos ser reconhecidos no meio dessa grande massa amorfa que se aglomera em arranha-céus das megalópoles. Vivemos na corda-bamba de nós mesmos.
Assim, quando o maior questionamento identitário chega para nós, mulheres, ficamos ainda mais balançantes entre deixar a coisa ir de acordo com o padrão (sentir as contrações, ter a dor do parto, vivenciar o nascimento em toda a sua plenitude fisiológica) ou seguir para o lado do anômalo (ser submetida a uma intervenção, receber cuidados médicos indispensáveis após o nascimento do filho). Você leitora certamente não há de discordar de mim: quando nos tornamos mães questionamos tudo o que fomos e fizemos desde que nascemos até aquele momento, nos percebemos em um dilema verdadeiramente profundo no qual pensamos sobre os papéis sociais que desempenhamos e vamos desempenhar e damos novos significados a nós mesmos, ao mundo, ao pai da criança: reinventamos tudo!
Não pretendo escrever um tratado de Sociologia (embora haja muito que relacionar entre Humanização do nascimento e transformações sociais), tampouco realizar uma psicologização barata sobre o nascer, mas acho verdadeiramente importante pensarmos nos rumos que a discussão sobre Humanização do nascimento toma com frequência. Porque o ponto nevrálgico (e por isso muito dolorido) da questão não gira em torno da questão da maternidade. Não se discute isso – ou, ao menos, não se deveria discutir. O incômodo real está ligado à nova significação que damos à idéia de “mulher” logo assim que nos tornamos mães.
Deste modo, ficar ofendida com a assertiva “cesárea não é parto” é, na verdade, ficar incomodada com a incapacidade de parir. O que, definitivamente, não tem nada a ver com a capacidade de ser uma mãe amorosa, zelosa e bacana para os filhos. Relaciona-se, isso sim, com uma idéia que vem colada, implícita na cirurgia cesariana: algo deu errado, algo saiu do padrão natural. E sair do padrão é uma moeda com duas faces, opostas, mas sempre co-existentes. Ou seja, embora submeter-se a cesárea dê certa satisfação momentânea, pois nos sentimos especiais e podemos ter alguns holofotes em cima de nós, também significa que seremos estigmatizadas pelo (possível) não-funcionamento correto do nosso corpo. (Aqui eu abro grandes parênteses porque quero deixar claro que nem todas as mulheres necessitam de atenção e acham legais os cuidados pós-cirúrgicos, mas todas nós conhecemos mulheres que não conseguem lidar bem com o fato de que todos os que vão até o hospital ou a casa da família após o nascimento, estão ali pelo bebê, e não por elas.) Podem reparar que a maioria das mulheres que foram levadas à cesárea dá, mesmo sem que sejam necessariamente inquiridas sobre, uma desculpa ou justificativa com respaldo médico: não tive contrações, minha bacia é estreita, o bebê era muito grande, o cordão umbilical não deixava o bebê descer/receber oxigênio etc. É a des-culpa sobre o não-funcionamento do corpo de mulher – ainda que isso seja relativo e, é claro, não signifique, em hipótese alguma, que a mulher que pariu é mais mulher do que uma que sofreu a cesárea; não, não é isso. E que socialmente pode haver um balanço incômodo em direção ao lado da moeda em que a coisa fora do padrão é vista como algo negativo.
Então, o que se pretende com tudo isso? Deixar bem claro que a questão do papel de mãe não passa pela discussão da Humanização do nascimento, no sentido de que, parindo, adotando ou sendo submetida a uma cirurgia, uma mulher pode ou não se tornar mãe; isso depende de outros fatores que não são necessariamente determinados na hora do nascimento, embora tudo esteja relacionado. O objetivo da discussão pela Humanização do nascimento é oferecer às mulheres informações para que saibam que nascer de parto é bem melhor e mais saudável do que nascer por meio de uma cirurgia. E mãe é mãe, parto é parto. E mulher é sempre, sempre, mamífera, mas não vaca.
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