Por Suely Carvalho
5 DE MAIO DIA MUNDIAL DA PARTEIRA
Durante centenas de anos as parteiras atuavam como sempre fizeram desde que a humanidade existe e sequer entendiam o quanto era importante. Diferente da maioria das profissões ser parteira é muito mais do que estar presente na hora do parto e nascimento ajudar a mulher e aparar o bebê. Não escolhemos esta profissão assim como as demais profissões onde as pessoas escolhem prestam vestibular e se aprovados cursam alguns anos recebem um título e acreditam estar prontas para exercer, torna-se profissional antes de ter a experiência apenas com a teoria e no máximo algum tempo de estágio. No ofício de parteira sentimos o chamado de alguma forma e geralmente nos aproximamos da prática seja com nosso próprio corpo ou com outras mulheres ou ajudando alguma parteira. Nascemos com o DOM, é missão de vida. Entendo que alguns outros ofícios também nascem com a pessoa. Dom é diferente de talento.
Como Parteira Tradicional, missão e Dom herdado das minhas ancestrais avós e bisavós parteiras as quais honro hoje e sempre, quero falar para minhas colegas companheiras de ofício para as queridas aprendizes e também falar sobre nós parteiras oportunamente neste momento de celebrações, reivindicações e denúncias que se ancora no decorrer do mês de maio.
Algumas parteiras se referem ao acaso, aconteceu de uma mulher vizinha ou parente começou o parto sozinha sem ter ninguém para ajudar e chamou, ou a que teve coragem chegou e ajudou seguindo a intuição, neste momento sentiu medo e alegria algo inexplicável. Aconteceu mais uma ou duas vezes e pronto ela ouviu o chamado e sabia que tinha o Dom de parteira mesmo necessitando de muito tempo e muito mais conhecimentos e experiências mas, estava iniciada. Outras parteiras aconteceu com seu corpo ao ter seus próprios partos fez quase tudo sozinha e sentiu claramente que era capaz e naturalmente as grávidas foram chegando e os bebês nascendo com sua ajuda. No seu dia a dia a parteira não fica em um consultório ou hospital cumprindo um horário de atendimento ela está fazendo outras coisas naturalmente e quando chega alguém chamando tudo passa para o segundo plano e a prioridade é a gestante em trabalho de parto sem ter hora para voltar para sua casa. Disponibilidade, dedicação e compromisso são combustíveis que mobilizam a parteira, quando volta prá casa está cansada algumas vezes sem o devido reconhecimento, mas leva paz na consciência gratidão no espírito e emoção no coração. Sensação de dever cumprido.
A cada parto aprendemos mais e mais por isso, quanto mais antiga mais experiente e mais sábia é a parteira. Diferente das profissões modernas que se dá todo mérito aos recém-formados no nosso caso de parteira o tempo e a experiência qualificam a profissional assim quando já idosa com muitas décadas de experiências não precisa mais estar nos partos, é mestra para ensinar e contar as histórias de vida e morte, de dor e alegrias, de bebês que se fizeram gente grande, de reconhecimentos e injustiças. Se ela formou aprendizes herdeiras do seu saber estas seguidoras irão beber dessa fonte e com segurança e determinação dar continuidade a essa tradição milenar honrando sua mestra e as ancestrais ante passadas.
Nos últimos anos em vários países, e o Brasil se inclui fortemente, estamos numa fase de emersão conquistamos visibilidade. Historicamente é cíclico que a existência e prática das parteiras emergem nas diferentes sociedades galgam visibilidade reconhecimento depois vem as tentativas de mudanças de descréditos por parte dos sistemas vigentes e de grupos sociais específicos, voltam as perseguições as iniquidades e as injustiças. Mais uma vez as parteiras voltam ao estado latente porém sem nunca deixar de atuar seguem na invisibilidade partejando silenciosamente e solitariamente como forma de cumprir a missão de sobreviver e continuar existindo. Embora muitas pessoas em diferentes sociedades acreditem que as parteiras não existem mais ou estão em extinção como parte da natureza, o elo jamais foi rompido, sobrevivemos a caça às bruxas no obscuro período da inquisição, sobrevivemos a hegemonia hospitalocêntrica criando a cultura da cesariana desnecessária e aqui estamos queridas amigas e companheiras parteiras, existimos porque resistimos, somos nós mesmas parteiras que sabemos o que fazer e como atuar nas horas de escuridão e injustiças, sabemos também que nas fases de euforia e modismos precisamos cuidar do que nos é mais precioso nosso Saber e prática repassado de geração em geração entre mulheres e homens de espírito feminino. Aqui estamos, em todos os lugares deste planeta presentes no momento sagrado em que um novo Ser brota da Pachamama saindo de dentro de uma mulher trazendo luz e esperança.
Hoje, 5 de maio de 2012 dia mundial da parteira, estou num lugar distante onde a natureza é uma explosão de vida força e beleza no alto da serra dos papagaios nas Minas Gerais, esperando o parto de uma jovem obstetriz, aprendiz de parteira do CAIS do Parto minha aluna. O bebê já está quase chegando. Hoje dia da parteira e é também a maior lua cheia do ano assim que nascer a Lua cheia de Budha faremos uma grande fogueira no quintal da casa desta mulher prestes a dar a Luz iremos celebrar a vida nova que chega plena de fé esperança e possibilidades, junto ao fogo iremos celebrar nossas ancestrais antepassadas parteiras que foram queimadas na fogueira da intolerância fogueira das vaidades fogueira das injustiças conhecida como inquisição. Iremos chamar a força dessas mulheres sábias ancestrais que antes de nós prepararam o caminho e cuidaram de preservar a cultura e a tradição, vamos honrar a existência delas e vamos honrar nossa própria existência para que tenhamos a mesma força e sabedoria de seguir na missão de parteira tradicional, para cumprir esse compromisso nascemos e aqui estamos.
Com o coração cheio de gratidão e amor abraço todas, comadres e compadres, alunas, companheiras, mestras, afilhadas e afilhados.
Axé, namastê, I hei yá, que a grande Mãe nos abençoe.
Suely Carvalho – 61 anos, 39 anos de ofício de parteira tradicional, duas filhas, um filho, 11 netos e netas, uma bisneta. Fundadora do C.A.I.S. do Parto - 1991, coordenadora da Rede Nacional de Parteiras Tradicionais do Brasil, cofundadora da REHUNA (Rede pela Humanização do Parto e Nascimento), cofundadora da RELACAHUPAN (Rede Latino Americana pela Humanização do Parto e Nascimento), vice-presidente da ALAPAR (Aliança Latino Americana de Parteiras - México), Assessora da ASOPARUPA (Associação de Parteiras Unidas do Pacífico - Colômbia), Rede de Escolas de Parteiras -Argentina, Instrutora da formação de aprendizes de parteiras tradicionais do CAIS do Parto, Griô, leitora de aura, rezadeira, curandeira xamânica.
E os resultados da Violência Obstétrica?
ResponderExcluirCumadre, parabéns pelo dia da Parteira. Muitas saudades!
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