sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Maternidade e carreira profissional, ou como conciliei em home-office a maternagem ativa

O coletivo FemMaterna organizou a Blogagem Coletiva Maternidade, Paternidade e Carreira Profissional, e venho contribuir com meu relato de experiência desses mais de quatro anos em que meu companheiro e eu maternamos nossa cria, um menino sapeca e falante, que como luz guia nossos passos, desde sua gestação. Nosso Deus do Amor, Rudá, em tupi guarani, como reza a lenda, semeia a amorosidade por onde passa!


Refletindo sobre esse trilhar não posso deixar de conectar a vinda desse que foi meu segundo filho com o nascimento do primogênito, do primeiro casamento, um canceriano sensível e querido, Ícaro, mas que, também como a lenda, voou para longe de mim, com apenas dois anos, e vive, atualmente, com o pai e sua madrasta, e já se tornou um pré-adolescente questionador, com 11 anos de idade, e que pouco eu vi crescer.

Foi a falta dessa maternidade, em feridas hoje já bastante cicatrizadas que quando engravidei de Rudá prometi a mim mesma que tudo seria diferente. A começar pelo parto, já que Ícaro veio ao mundo por uma cesárea intraparto, daquela menina de pouco mais de 22 anos, que apesar de graduada pouco sabia sobre o sistema obstétrico brasileiro, tendo como fonte a Revista Crescer e Cia.

Nesta segunda gestação, numa fase bem difícil da vida, não planejada, com poucos recursos financeiros, tivemos a revelação, com o exame de farmácia. Nas próximas semanas da novidade, dois projetos que havíamos enviado foram aprovados, pela Secretaria de Cultura, do Governo de São Paulo, pelo Programa de Ação Cultural (ProAC) e Juliano passou no vestibular, dando início, no ano seguinte, os estudos em Agronomia, em outra cidade.

Nesta época estávamos na Ilha de Cananéia, onde Rudá nasceu, em nossa casa, nove meses depois, em um parto demorado, mas transformador - literalmente.

Desde aquele 23 de agosto de 2009 que nossas vidas nunca mais foram a mesma, e olhando agora para ele, que brinca ao meu lado enquanto escrevo essas palavras, faria tudo e mais um pouco de novo!

Com o parto domiciliar, a criação com apego foi inevitável, para mim. Amamentação exclusiva, até o sexto mês, e sob livre demanda, sendo prorrogada até seus dois anos e dois meses, quando houve o desmame, associada a cama compartilhada e aos cuidados integrais com aquele bebê que mostrou qual caminho, aquele do coração, que eu deveria seguir.

Organização e participação no evento Dia da Parteira, em Cananéia/SP
Foto de Leandro Cagiano.

Eu já tinha uma rotina de trabalho em home-office, como pesquisadora na área da Antropologia, com comunidades tradicionais caiçaras e ribeirinhas, e assim foram os primeiros anos de sua vida, agarrado no sling em nossas saídas-de-campo, nas assembleias de uma ONG em que éramos associados, nas vivências, cursos, formações. Todo tempo ele estava lá! E, para mim não poderia ser diferente!

Intercâmbio cultural em um quilombo carioca.

Com quatro meses prestei um concurso para professores do Estado de São Paulo, e passei em segundo lugar do Vale do Ribeira, sem ao menos ter consultado a bibliografia antes da prova. Prova em que Rudá também estava, com o pai, e que foi amamentado entre uma questão e outra. Eu teria dez aulas de Sociologia garantidas, todos os anos, mais os benefícios que a categoria permitia, porém, a amamentação como eu sonhava teria que ser mudada, ou tirando o leite, ou introduzindo leite artificial. A decisão?! Não, obrigada. E, foi aí que eu entendi que aquela maternidade ativa tinha sido uma escolha consciente, e que por ela eu abriria mão de outras coisas, mas muito menos importantes do que Rudá.

Fechamento de encomenda, com cria a tira-colo e direito a joinha!

Isso não quer dizer que não trabalhei. Desde lá foram intensos anos de muita labuta, escrita - com a criação deste blog, com Ana Carolina, em dezembro do mesmo ano de nascimento de nossos filh@s - de projetos culturais aprovados e coordenados, de quatro livros publicados - sendo o último sobre as parteiras tradicionais caiçaras - da descoberta pela paixão pela costura e bordados, com a criação do empreendimento feminino Comadres, onde eu e duas comadres amadas produzimos peças exclusivas e utilitárias. Além dessas tantas e diversas funções, iniciei um caminho na sagrada arte de partejar, através da Escola de Aprendizes de Parteira na Tradição, pelo CAIS do Parto, em Olinda-PE, atuando, ainda, como doula, e tendo a alegria de acompanhar outras mulheres, que como eu, tomaram a rédea de seus partos, e tiveram suas vidas transformadas pela maternidade.

Há pouco mais de quarenta dias nos mudamos de nosso chalezin, na ilha cercada pelas majestosas montanhas e estamos em Botucatu, interior paulista.  O motivo foi uma escola não tradicional para Rudá, onde ele não será alfabetizado aos quatro anos de idade, e sim irá brincar, correr, cantar, ouvir histórias e fábulas, enfim, irá ser o que uma criança dessa idade deveria ser, criança! Com esta nova etapa, novos caminhos profissionais para meu companheiro e eu estão se construindo, com vagarosidade e calma. Fase de adaptação, de nostalgia, de aperto no peito, lágrimas nos olhos, questionamentos, mas como disse uma amiga esses dias é para fazer a semente que está lá na terra esticar, brotar, florescer e semear novamente.


Assim, finalizo essas minhas impressões, tão sinceras com a minha verdade, na contramão de uma sociedade e seu status quo, que extraí, terceriza, medica, e pouca (ou quase nenhuma) importância dá a maternidade - reflexo do patriarcado, e da dominação em que nós mulheres sofremos, há muitos anos. Desta forma, posso dizer que para ser mãe não precisamos deixar nossa carreira profissional, e sim podemos adaptá-la, tendo em vista que essa primeira infância, tão sagrada e única, dura pouco, e lá na frente teremos saudades dela, ao ver nossos "...filhos fortes, sonho semeando o mundo real..."


* Confira outras histórias aqui!

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